segunda-feira, 30 de maio de 2011

Decanos da Saúde Pública brasileira interpelam Ministro da Saúde sobre a parceria com o McDonald's

Senhor Ministro Alexandre Rocha Santos Padilha, acabamos de tomar conhecimento do envolvimento do Ministério da Saúde em campanha publicitária da rede de lanchonetes da empresa McDonald’s no Brasil.

A nosso ver, este envolvimento não se coaduna com o histórico do Ministério da Saúde na promoção da segurança alimentar e nutricional da população brasileira e com a elogiável prioridade que sua gestão tem consignado para a promoção da alimentação saudável e para o controle das doenças crônicas não transmissíveis.

A campanha da rede McDonald’s, à semelhança de outras estratégias de marketing empregadas pela mesma empresa, é extremamente nociva, em particular para crianças e adolescentes, que são o público alvo daquela rede.

Estamos nos referindo especificamente ao uso nas lojas da rede McDonald's de toalhas de bandeja que reproduzem, lado a lado, material educativo elaborado pelo Ministério da Saúde e publicidade dos produtos comercializados pela rede.

Como o senhor poderá facilmente verificar, em um dos lados da toalha há mensagens que exaltam a importância para a saúde da prática de atividade física, da ingestão de água, do sono, da proteção contra a exposição excessiva ao sol e da alimentação saudável. Junto a essas mensagens, são mostrados o símbolo da empresa e seu slogan ‘amo muito tudo isso’, o website e o Disque-Saúde do Ministério da Saúde e a referência ao Ministério como fonte das mensagens educativas.

No verso da toalha, há a reprodução do cardápio dos produtos oferecidos pela rede - sanduíches, batatas fritas, saladas, molhos, bebidas e sobremesas - com informações (em letras miúdas) sobre sua composição nutricional. Essas informações são encimadas pela frase ‘Veja aqui os componentes nutricionais da sua refeição’.  Abaixo do cardápio, há um quadro com o título: ‘Veja algumas informações nutricionais interessantes’. Neste quadro apresenta-se a composição nutricional do que, para a rede McDonald’s, seriam ‘outros alimentos do seu dia a dia’. Esses alimentos incluem ‘coxinha’, ‘empadinha’, ‘pastel’, ‘pizza’ e ‘feijoada tradicional’. 

É ocioso notar que o objetivo dessa campanha da rede McDonald’s é associar o consumo dos produtos que ela comercializa a comportamentos saudáveis e a induzir o consumidor a pensar que esses produtos deveriam ou poderiam ser consumidos frequentemente (‘alimentos do dia a dia’) e a negar que eles pudessem ser menos saudáveis do que alimentos tradicionais da dieta brasileira. Ainda mais ociosa é a constatação de que a inscrição dos símbolos do Ministério da Saúde no material publicitário da empresa legitima a campanha e aumenta em muito sua eficácia.

Senhor Ministro, a própria composição nutricional do cardápio da rede Mcdonald’s, descrita nas toalhas, revela quão enganosa é esta campanha publicitária. Por exemplo, a ingestão de um Big Mac (que não é o maior dos sanduíches oferecidos no cardápio) acompanhada de uma porção média de batatas fritas, de um copo médio de refrigerante e de uma porção pequena do sorvete com calda da rede fornece dois terços do total de calorias que um adulto poderia consumir ao longo de todo o dia e praticamente todas as calorias diárias necessárias para uma criança. Se a opção for pelo sanduíche Big Tasty e por porções grandes dos acompanhamentos e sobremesa, as calorias ingeridas em uma única refeição alcançam o limite superior estabelecido para um adulto em todas as refeições do dia. A situação fica ainda mais grave se o cálculo da composição nutricional envolver a ingestão de nutrientes que aumentam o risco de doenças cardiovasculares, diabetes e outras graves doenças crônicas. Por exemplo, o consumo de um único Big Tasty corresponde, segundo recomendações da Organização Mundial de Saúde adotadas pela ANVISA, a 63% de todo o sódio que o indivíduo poderia ingerir por dia e a 109% da ingestão diária máxima de gorduras saturadas.
    
Como certamente é do seu conhecimento, as pesquisas de orçamentos familiares do IBGE vêm mostrando que alimentos tradicionais e saudáveis da dieta brasileira, como a mistura arroz e feijão, vem sendo crescentemente substituídos por bebidas e alimentos ultra-processados, que são densamente calóricos e têm conteúdo excessivo de gordura saturada, açúcar e sódio como a imensa maioria dos produtos comercializados pela rede McDonald’s.

Senhor Ministro, essas mudanças no padrão alimentar da população brasileira colocam em risco importantes avanços obtidos pela Saúde Pública brasileira nas últimas décadas. O aumento epidêmico da obesidade é a expressão mais dramática das consequências do crescimento do consumo de alimentos ultra-processados. Na mais recente pesquisa do IBGE, realizada em 2008-2009 com a colaboração do Ministério da Saúde, constatou-se que apresentavam peso excessivo metade dos adultos brasileiros, um em cada cinco adolescentes e uma em cada três crianças de 5 a 9 anos de idade. Dados do sistema VIGITEL, operado pelo próprio Ministério da Saúde nas capitais de todos estados brasileiros e no Distrito Federal, indicam que, se nada for feito, em cerca de doze anos alcançaremos a situação calamitosa enfrentada pelos Estados Unidos, onde dois terços da população adulta têm excesso de peso.

Senhor Ministro, diante dos fatos brevemente relatados nesta carta e conhecedores do seu compromisso com a Saúde Pública, pedimos-lhe que ordene a imediata desvinculação das marcas, programas e imagem do Ministério da Saúde do Brasil da marca, produtos e campanhas da empresa McDonald’s.

30 de Maio de 2011


Carlos Augusto Monteiro
César Gomes Victora
Malaquias Batista Filho
Professor Titular da Universidade de São Paulo e Membro da Academia Brasileira de Ciências
Professor Emérito da Universidade Federal de Pelotas e membro da Academia Brasileira de Ciências
Professor Emérito da Universidade Federal de Pernambuco e Membro do Conselho de Segurança Alimentar e Nutricional (CONSEA)

Carta ao Ministro de Estado da Saúde



Ao Exmo.

Senhor
Ministro de Estado da Saúde
Alexandre Rocha Santos Padilha

São Paulo, 30 de maio de 2010.

Prezado Senhor Ministro Alexandre Padilha,

As redes e organizações da sociedade civil e instituições de pesquisa que compõem a  Frente pela Regulação da Publicidade de Alimentos[1] vem manifestar nossa indignação com a vinculação entre as marcas, programas e imagem do Ministério da Saúde do Brasil com a marca, produtos e campanhas publicitárias da empresa McDonald´s.

Não se justifica, em hipótese alguma, o Ministério da Saúde associar sua imagem a de empresas como Mc Donald´s atribuindo-lhes o título de “Parceiro da Saúde”, uma vez que a sua principal atividade é a comercialização de alimentos que, em sua grande maioria, fazem muito mal à saúde.  

Dados das Pesquisas de Orçamentos Familiares, realizadas periodicamente no Brasil pelo IBGE, indicam a crescente substituição de alimentos tradicionais e saudáveis da dieta brasileira, como a mistura arroz e feijão, por bebidas e alimentos ultra processados, densamente calóricos e com baixa concentração de nutrientes. Essa substituição é extremamente prejudicial à saúde da população e coloca em risco os avanços obtidos pela Saúde Pública brasileira nas últimas décadas. O crescimento vertiginoso da obesidade no país talvez seja a expressão mais dramática das conseqüências do crescimento do consumo de alimentos ultra processados, dentre os quais estão os hambúrgueres, batata frita, refrigerantes oferecidos e promovidos pela rede McDonald’s. Na mais recente pesquisa nacional, realizada em 2008-2009, o IBGE constatou que apresentavam peso excessivo metade dos adultos brasileiros, um em cada cinco adolescentes e uma em cada três crianças de 5 a 9 anos.

Impulsionadas pela pressão de empresas como o McDonald’s, essas transformações nos padrões alimentares e no estado nutricional de milhões de brasileiros e cidadãos de todo o mundo  requerem respostas inadiáveis e corajosas por parte dos governantes de modo a deter o avanço explosivo nas mortes e no adoecimento da população pelas doenças crônicas não-transmissíveis intimamente relacionadas à alimentação.

É necessário cuidado especial com as nossas crianças que devem crescer em um ambiente que favoreça seu máximo potencial de desenvolvimento, o que inclui a garantia da proteção contra os produtos comercializados e práticas de marketing empregadas por empresas como o McDonald’s. Os alimentos comercializados por essa empresa são na sua grande maioria contra indicados para o consumo frequente, principalmente por crianças e adolescentes que acumulam riscos ao longo de suas vidas até apresentarem doenças crônicas precocemente. Quando o Ministro da Saúde aparece na grande imprensa ao lado da empresa, promove confusão, deseduca a população.

A atual geração de crianças estadunidenses talvez seja a primeira, na história dos EUA, a viver menos tempo do que seus próprios pais. Se o governo brasileiro não adotar medidas rigorosas para ao menos frear o avanço da obesidade entre a população, de acordo com pesquisas conduzidas por este Ministério, em aproximadamente 12 anos o Brasil estará neste mesmo patamar. Isto implica não só uma maior sobrecarga nos agravos que provocam mortes e sofrimento de milhões de brasileiros, mas numa sobrecarga colossal sobre o sistema de saúde que até mesmo em países ricos comprometeria a economia e seu desenvolvimento.

Quando o Ministro da Saúde aparece na grande imprensa como parceira de empresas como o Mcdonalds está na prática veiculando mensagem para a população que contradiz a promoção da alimentação saudável e de outras políticas do  governo federal, tais como o Programa de Aquisição de Alimentos e o Programa Nacional de Alimentação Escolar. Esses programas buscam valorizar o consumo de alimentos frescos, regionais e próprios de cada bioma brasileiro.  É óbvio que as empresas são as maiores beneficiadas pela “parceria”, uma vez que se utilizam do título de “amiga da saúde” para passar uma mensagem positiva para os seus consumidores, estimulando ainda mais o consumo dos produtos que comercializam.

Esperamos que o Ministro de Estado da Saúde compartilhe de nossa preocupação e desvincule imediatamente as marcas, programas e imagem do Ministério da Saúde do Brasil da marca, produtos e campanhas da empresa McDonald’s.

A população brasileira, em especial nossas crianças, contam com seu apoio para proteger as políticas públicas da interferência de interesses comerciais centrados no lucro proveniente de modos de consumo e produtos que comprometem o bem-estar, saúde e o direito humano à alimentação do povo brasileiro.

Atenciosamente,
Frente pela Regulação da Publicidade de Alimentos



[1] A Frente pela Regulação da Publicidade de Alimentos é formada por  57 organizações e redes da sociedade civil e instituições de ensino e pesquisa e tem como lutar para que o poder público estabeleça normas que regulem a publicidade de alimentos, monitore o cumprimento dessas normas de modo a evitar prejuízo à saúde da população e puna severamente todos que as descumprirem. A lista dos membros da Frente pode ser acessada no seguinte endereço: http://regulacaoalimentos.blogspot.com/

quinta-feira, 19 de maio de 2011

Abaixo-assinado pela regulamentação da publicidade e propaganda de alimentos

O Centro Acadêmico Emílio Ribas, iniciou um movimento na Faculdade de Saúde Pública, devido a estudantes que se incomodaram com a presença de representantes das indústrias ministrando aulas e expondo seus produtos. O Centro apresentou uma carta na Comissão de Graduação, que foi aprovada como documento de recomendação aos professores, porém, foi insuficiente e buscam uma regulamentação que proíba tais condutas. Com grande repercussão, com o assunto sendo pautado em outras universidades, realizaram uma mesa-redonda na semana passada, o qual poderá ser acessado em breve, e criaram um abaixo-assinado, a ser enviado para o CFN, MS e MEC, ampliando a regulamentação para além da FSP.

Abaixo-assinado pela regulamentação da publicidade e propaganda de alimentos, fórmulas infantis e de nutrição enteral e parenteral em ambientes cadêmicos relacionados aos cursos de Nutrição
http://www.peticaopublica.com.br/PeticaoVer.aspx?pi=P2011N9540